quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Continua a propaganda indiscriminada de remédios na TV e rádio, e ninguém faz nada!

Em 26/5/2014 fiz uma postagem sobre a absurda e criminosa permissividade com que se faz propaganda de remédios e bebidas alcoólicas no Brasil. No  tocante às bebidas alcoólicas -- principalmente cervejas -- houve uma melhora, mas quanto aos remédios nada mudou. Como o lobby da indústria farmacêutica é fortíssimo, o que se vê é a omissão cúmplice e delinquente do Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), do Congresso Nacional, do Ministério da Saúde (especialmente via Anvisa), do Ministério Público, do Conselho Federal de Medicina e da sociedade em geral. Por trás dessa propaganda, por trás do balcão (no atacado e no varejo), estão certamente por ação ou omissão a Febrafarma - Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica, a ABF - Associação Brasileira de Farmacêuticos e o CFF - Conselho Federal de Farmácia. 

A propaganda indiscriminada de medicamentos no rádio e na TV estimula a automedicação dos ouvintes e telespectadores, já altíssima e preocupante no Brasil, desprestigia os médicos e prestigia os farmacêuticos. Ainda assim, nas farmácias brasileiras a presença dos farmacêuticos chega a ser supérflua e dispensável, porque cada balconista é um especialista universal para todas as doenças e tem um remédio na ponta da língua para cada achaque do "cliente". 

A automedicação ou o mau uso de remédios intoxica três pessoas por hora no Brasil. A cada ano, 27 mil brasileiros passam mal ao ingerir remédios de forma errada e, na média, 73 acabam morrendo. O país registrou 138.376 intoxicações e 365 mortes causadas por medicamentos entre 2008 e 2012, seja por acidente, tentativa de suicídio, uso terapêutico ou erro de administração. Esses são os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Os fármacos respondem por 27% das intoxicações, à frente dos agrotóxicos e animais peçonhentos, por exemplo. O cenário é preocupante, dado um mau hábito do brasileiro.

O uso indevido de remédios tornou-se um problema de saúde pública decorrente da medicação por conta própria. Sete entre dez brasileiros costumam ingerir remédios sem orientação médica, confiando antes na própria avaliação ou na opinião de parentes e amigos. Após entrevistar 1.480 pessoas em 12 capitais, o Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ) traçou o mapa da automedicação no país.

Em Salvador, 96% dos habitantes se automedicam. A menor taxa está em Belo Horizonte, com 35%. Curitiba tem um índice de 66%, pouco abaixo da média nacional (76,4%).

O mais alarmante é que, para potencializar os efeitos terapêuticos, 32% dos brasileiros declaram aumentar por conta própria a dose do medicamento prescrita pelo médico, odontólogo ou farmacêutico. A liderança desse ranking é de Curitiba, onde 65% dos habitantes aumentam a dose.

No grupo dos que tomam remédio por conta própria, 72% afirmaram confiar na indicação de medicamentos feita pela família, 42,4% acreditam na recomendação de amigos, 17,5% se fiam no conselho de colegas de trabalho ou estudo e 13,7% confiam na opinião de vizinhos (cada entrevistado podia indicar mais de uma opção). Apenas 23,6% declararam consumir medicamentos só quando prescrito pelo médico, odontólogo ou farmacêutico. Em Curitiba, esse índice é de 34%.

Risco

O estudo afirma ainda que 61,4% das pessoas que se automedicam estão conscientes sobre os riscos. Segundo os dados coletados pelo ICTQ, existe uma tendência de diminuição do consumo irregular de medicamentos controlados desde que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a exigir a retenção da segunda via da receita dessa categoria de remédios.

Nos últimos dois anos, houve redução de 60% no autoconsumo de remédios controlados pela Anvisa. Em 2014, apenas 8,2% declararam consumir medicamentos tarja preta ou tarja vermelha – aqueles com retenção de receita – sem consultar o médico. Em 2012, este índice era de 20%.

Costume dos pais põe crianças em perigo

Crianças são parte significativa das vítimas da automedicação, não por vontade própria. Presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná, o pediatra Maurício Marcondes Ribas trabalha no Hospital Evangélico, em Curitiba, e com frequência se depara com uma intoxicação do gênero. A causa nem sempre é o remédio ao alcance dos pequenos. Muitas vezes a razão é um hábito de quem pensa estar fazendo o bem para o filho, quando na verdade está fazendo mal.

Ribas adverte que não há medicamento que não tenha algum potencial efeito colateral. E quanto mais imaturo for o organismo, pior pode ser a automedicação. A literatura médica recomenda não medicar alguém com febre abaixo de 38,5 °C, muito menos criança. Não é o que acontece. Ao notarem o filho um pouco febril, muitos pais dão por conta própria algumas gotas de antitérmico para ele dormir melhor.

Gotinhas do mal

Ao deduzir que meia dúzia de gotinhas não farão mal, os pais desconhecem que esse tipo de medicamento pode reduzir a produção de células de defesa para infecções ou causar reações alérgicas, para citar apenas dois exemplos. Cada pessoa responde de maneira diferente a determinado medicamento e, dependendo da dose, no caso do paracetamol ele pode afetar, por exemplo, as funções hepáticas.

Segundo Ribas, é comum o quadro se agravar quando a criança tem vários cuidadores, já que nem sempre o pai, a mãe ou os avós podem ficar o tempo todo com ela. Quando está febril, ela pode ficar parte do tempo com a mãe, outra hora com o pai, ou com o avô ou a avó. Um deles dá uma aspirina, outro dá um paracetamol, outro oferece um AAS. Quando alguém se dá conta – se uma hora alguém se der conta –, a criança já tomou muito mais remédio do que deveria.

Estatísticas

☛ 18,4% declararam consumir antibióticos, nos últimos 12 meses, sem antes consultar o médico. O controle de venda desses remédios é mais recente. A tendência é de que o consumo caia mediante controle, como vem ocorrendo com os medicamentos tarja preta.

☛ As classes terapêuticas mais consumidas no Brasil são analgésicos (18%), anti-hipertensivos (15%), anticoncepcionais (7%), anti-inflamatórios (6%), vitaminas (6%), remédio para colesterol (5%) e antidepressivo (5%).

Farmacêutico aponta causas da automedicação

Embora a automedicação não seja problema exclusivo do Brasil, três fatores contribuem para que os índices sejam mais altos no país, na avaliação do farmacêutico Dirceu Raposo de Mello, ex-diretor presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e atual presidente do Conselho Científico do Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ).

Mello começa pela propaganda massiva de fármacos, que pode influenciar tanto a prescrição médica quanto levar ao consumo por conta própria, sem receita. Depois, menciona a “automedicação responsável” preconizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e conclui com a dificuldade de acesso a serviços de saúde no país. A isso tudo, some-se a facilidade de acesso a medicamentos.

Foi na passagem de Mello à frente da Anvisa, entre 2005 e 2011, que a agência reguladora começou a impor restrições à propaganda de medicamentos. Nessa época também foram iniciadas as discussões para outras mudanças que viriam numa resolução de 2012 da Anvisa. Desde então, remédios vendidos sem prescrição médica, como antitérmicos, analgésicos e digestivos, passaram a ter de ficar atrás do balcão (perto daqueles vendidos com receita) e não mais dispostos em gôndolas nas farmácias.

Como dito na minha postagem já citada,  dipirona sódica foi banida da Suécia em 1974, dos Estados Unidos em 1977, assim como em mais de 30 países como Japão, Austrália, Irã e parte da União Européia. Na Alemanha a dipirona sódica somente é vendida com receita médica. Na Suécia a dipirona sódica foi re-introduzida em 1995 e banida novamente em 1999. Por que, então, ela é permitida no Brasil?!

Uma característica perversa, maquiavélica e claramente intencional da propaganda de todos os medicamentos na TV pode ser clara e imediatamente contatada em pelo menos dois pontos: 

Todas as mensagens de "alerta" (do tipo "se os sintomas persistirem procure o médico", "este medicamento não é recomendado no caso de dengue" e outras do gênero) são rapidíssimas e apresentadas sempre sobre fundo azul, que é uma cor sabidamente repousante e que não transmite nenhuma sensação de "alerta" e de risco/perigo -- raramente, surge um fundo preto; o vermelho, cor clássica para caracterizar situação de risco ou perigo, jamais é usado. Observar que o médico só é citado "se os sintomas persistirem", incentivando-se assim o autodiagnóstico e relegando-se o médico a um segundo plano.

● As mensagens de "alerta" são lidas a jato, de maneira praticamente ininteligível, caracterizando a má-fé do anunciante.

Para ilustrar o dito acima, selecionei vídeos de algumas propagandas veiculadas na TV.


Propaganda de Doril Enxaqueca (Fonte: YouTube)

Propaganda do Fluviral (Fonte: YouTube)

Propaganda de Coristina D (Fonte; YouTube)

É preciso fazer-se um movimento de protesto, exigindo a suspensão da propaganda de medicamentos na TV.

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PS - Quase me esqueço das propagandas de carros. Praticamente em todas elas eles são dirigidos em alta velocidade, estimulando os telespectadores a essa prática perigosa para eles e para quem estiver perto deles. 




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