sábado, 10 de janeiro de 2015

Um estudo interessante sobre a origem dos imigrantes que chegam à França

No momento em que ocorrem atentados terroristas na França e aumentam as tensões em vários países, especialmente na Europa, contra imigrantes, com ênfase nos que professam o islamismo -- ver, por exemplo, o que acontece no momento na Alemanha -- parece-me interessante ler as conclusões de um estudo recém-publicado na França sobre as principais nacionalidades dos 200.000 novos imigrantes que chegam anualmente ao território francês. Essas conclusões contrariam certos estereótipos existentes a esse respeito. Traduzo a seguir a reportagem publicada no site francês L' Internaute sobre as conclusões desse citado estudo. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

De onde vêm (realmente) os imigrantes que chegam à França?



Os imigrantes que entram legalmente na França são cada vez mais europeus -- (© L'Internaute/Dados do Insee)

O Insee [Instituto Nacional da Estatística e dos Estudos Econômicos, o IBGE francês] publicou em novembro um relatório sobre "os imigrantes recentemente chegados à França". É o momento para o L'Internaute.com fazer um balanço sobre os números e as nacionalidades de origem dos 200.000 novos imigrantes que chegam anualmente ao solo francês.

O total de entradas em território francês no período de 10 anos

No início de 2013, viviam em território francês 5,8 milhões de imigrantes ou seja, 8,8% da população residente na França. Isso representa 800.000 a mais do que havia em 2004 -- eles representavam então 8,0% da população. Dos anos 1970 aos anos 1990, a parte dos imigrantes proveniente da Europa tendia a diminuir em comparação com os oriundos da África (incluindo o Magrebe) [Magrebe é a região noroeste da África, dividido em "Pequeno Magrebe" (Marrocos, Saara Ocidental, Argélia e Tunísia) e o "Grande Magrebe", acrescido de Mauritânia e Líbia]. Na última década, essa tendência se inverteu.

China: origem de 3% dos imigrantes que chegaram em 2012



A imigração asiática é majoritariamente feminina -- (© L'Internaute/Dados do Insee)

Segundo as estimativas do Insee, o contingente chinês representa 3% do total dos imigrantes que chegaram à França em 2012. Duas características se destacam: a juventude e a porcentagem de mulheres. O Instituto estima que metade dos novos imigrantes tem entre 20 e 26 anos. Por outro lado, 67% deles são mulheres (ao contrário por exemplo do caso de Portugal, em que esse contingente é de 45%). Se essa tendência pudesse se explicar há alguns anos pela vontade de conseguir um marido, hoje em dia esse não é mais o caso. Essa população, de alta porcentagem feminina e muito escolarizada -- 62% dos imigrantes de 2012 tinham um diploma e mais de 90% tinham o equivalente a um bacharelado [exame final do curso secundário -- na França, é o diploma que dá acesso ao ensino superior] -- está mais provavelmente à procura de oportunidades profissionais.

Romênia: origem de 3% dos imigrantes de 2012


7 OK Hugh ONeill Fotoliacom © Hugh O'Neill - Fotolia.com

Desde 01 de janeiro de 2014, cessaram as medidas transitórias aplicadas com relação aos cidadãos búlgaros e romenos após a adesão de seus países à União Europeia. Entre as pessoas nascidas na Romênia que chegaram àFrança em 2012, uma em cada dez declarou possuir um emprego no início do ano seguinte. Foram tomadas iniciativas para atrair médicos romenos para os desertos médicos franceses. Os números aqui indicados pelo Insee se referem à imigração legal. A comunidade "Rom" [palavra francesa derivada de "romani", que designa os ciganos (tsiganes ou tziganes, em francês), membros de um povo originário da Índia que chegou à Europa por volta do século XIV, que leva uma vida nômade e vive de pequenos trabalhos; a palavra "Rom" engloba os ciganos e os manouches], amiúde de origem romena (por seu lugar de nascimento) se compõe de cerca de 20.000 pessoas em território francês, segundo uma pesquisa feita pelo ministério da Habitação.

Tunísia: origem de 3% dos imigrantes de 2012



O número total de imigrantes tunisinos é inferior ao de argelinos e marroquinos -- (© Kiddaikiddee - Fotolia.com)

Os problemas políticos que se seguiram à Primavera Árabe (que surgiu no país no final de 2010) forçaram sem dúvida uma parte da população a se deslocar para a França: o número de imigrantes nascidos na Tunísia aumentou 2,9% entre 2009 e 2012. Se o número total é inferior ao de seus vizinhos, a população do país (11 milhões de habitantes) não representa senão um terço da de cada um de seus dois vizinhos. O fator político poderia igualmente explicar a fraca participação das mulheres (44%) entre os novos imigrantes com relação aos provenientes do Marrocos e da Argélia, onde o reagrupamento familiar é uma das principais explicações. Os tunisinos são os mais bem instruídos entre os indivíduos oriundos do Magrebe que chegaram à França em 2012 (36% dos novos imigrantes tinham um diploma universitário). 

Bélgica: 3% dos imigrantes de 2012


Franceses e belgas se acomodam bem de um lado e outro da fronteira - (© Pamela Uyttendaele - Fotolia.com)


Nos últimos meses, a imprensa [francesa] tem ecoado a questão das evasões fiscais rumo à Bélgica. No entanto, esse fluxo funciona bem nos dois sentido, e desde muito tempo. Nos anos 1870-1880, os donos de usinas e minas do norte [da França] trouxeram dezenas de milhares de belgas, uma mão de obra considerada à época como mais barata.  Hoje, a sina dos belgas que se instalam na França é menos trágica. Em geral, são mais velhos que a média dos imigrantes que chegam ao território francês (idade média: 30 anos), enquanto um em cada dois novos imigrantes afirma ter conseguido trabalho poucos meses após sua chegada. Mais de 70% dos imigrantes belgas têm um diploma secundário ou superior.

Alemanha: 4% dos imigrantes de 2012



Um grande número de alemães migra para a França para aí trabalhar - (© defotoberg - Fotolia.com)

A expressão "Wie Gott in Frankreich" ("Como Deus na França") parece sempre justificada. 4% dos estrangeiros estabelecidos na França em 2012 tinham nacionalidade alemã.  Ao contrário da imigração britânica, não se trata de imigração relacionada com o momento da aposentadoria mas sim vinculada a trajetórias profissionais: a idade média dos imigrantes alemães é de 25 anos, contra os 36 anos das pessoas oriundas do Reino Unido. Especialmente tendo-se em conta que a taxa de emprego é elevada: 75% dos homens e 65% das mulheres declararam ter emprego no início de 2013. Junto com os imigrantes chineses, os alemães são os que mais chegam sozinhos: 32% dos homens e 25% das mulheres vivem sozinhos (é muito mais do que o que ocorre com as pessoas de nacionalidade belga ou italiana). 

Itália: 4% dos imigrantes de 2012


Os laços migratórios entre França e Itália datam de 150 anos -- (© voodomax - Fotolia.com)

Se a imigração italiana foi uma das mais volumosas na França no século XX, ela encolheu ao longo das três últimas décadas. Entretanto, ela teve uma recuperação no últimos anos, já que 4% dos imigrantes que entraram na França tinham nacionalidade italiana, segundo os dados do Insee. À semelhança dos espanhóis, trata-se frequentemente de jovens diplomados à busca de emprego. A idade média dos imigrantes italianos é de 25 anos (que é ligeiramente acima da média da imigração espanhola e ligeiramente abaixo da idade média da imigração portuguesa). Sua integração ao mercado de trabalho é entretanto ligeiramente menos favorecida: 71% dos homens e 51% das mulheres de origem italiana chegados à França em 2012 tinham um emprego no início de 2013.

Reino Unido: 5% dos imigrantes de 2012


Os britânicos frequentemente preferem viver sua aposentadoria na França - (© arkna - Fotolia.com)

Ela é mais conhecida nos campos do que nas cidades. A imigração britânica se reforça, pois esse contingente representou 5% dos imigrantes que entraram em território francês em 2012, segundo o Insee. Três caraterísticas a distinguem. De imediato, a idade elevada: o imigrante britânico tem em média 36 anos, contra os 25 anos dos imigrantes italianos e espanhóis. Em seguida, uma forte concentração no lado oeste da França ( em particular, as zonas rurais da Baixa Normandia, Aquitânia, Limousin ou Poitou-Charentes). Finalmente, trata-se de uma população de boa formação escolar pois, segundo as estimativas, a metade dos que aqui entraram em 2012 possuía diploma universitário. O clichê de um aposentado britânico se instalando em uma casa de campo na Dordonha parece confirmado ...

Espanha: 5% dos imigrantes de 2012


Cerca de 10.000 espanhóis estão estabelecidos na França - (© Kiddaikiddee - Fotolia.com)

É uma das tendências fortes ligadas à crise econômica. Com uma taxa de desemprego entre os jovens superior a 50%, mais de 10 mil espanhóis optaram por se estabelecer na França em 2012. As cifras confirmam o fluxo de jovens diplomados à procura de um emprego: 78% dos imigrantes tinham o equivalente a um bacharelado ou um diploma universitário, enquanto a idade média do imigrante era de 24 anos. Um ano a menos que os imigrantes do Magrebe. 7 em cada 10 imigrantes declararam ter um trabalho no início de 2013, segundo os dados do Insee. Depois de Portugal, a Espanha é o segundo país cujos imigrantes melhor se integram ao mercado de trabalho francês. Essa imigração, que teve um primeiro pico nos anos 1960-1970, permanece importante.

Argélia: 7% dos imigrantes de 2012



Entre 2009 e 2012, o número de imigrantes argelinos na França recuou ligeiramente - (© YL Photographies - Fotolia.com)

Os laços migratórios que unem França e Argélia há meio século não se desmentem. 7% dos imigrantes que entraram na França metropolitana em 2012 nasceram nesse país do Magrebe. A reaproximação familiar parece ser um dos principais fatores para isso: 72% das mulheres se declararam parte de um casal quando chegaram. A integração imediata desses cidadãos argelinos ao mercado de trabalho francês parece delicada. Apenas 26% dos homens e 7% das mulheres declararam estar empregados no início de 2013 (contra 80% e 44% para os homens e mulheres, respectivamente, vindos da Polônia para a França). Entre 2004 e 2012, a parcela dos diplomados cresceu significativamente, passando de 38% para 50%, mas permanece uma das mais fracas entre os 17 países avaliados diretamente pelo Insee.

Marrocos: 7% dos imigrantes de 2012




Aí também os laços antigos não se distenderam. Segundo as cifras do Insee, 7% dos imigrantes que entraram na França em 2012 nasceram no Marrocos. Contrariamente às imigrações vindas da Argélia, que tiveram um recuo entre 2009 e 2012 (- 2,6% ao ano), a imigração vinda do Marrocos cresceu no mesmo período (+ 2,4% por ano). A idade média do imigrante marroquino foi de 26 anos, um valor sensivelmente igual aos de seus vizinhos. A parcela de diplomados (com equivalência ao bacharelado) cresceu, deixando supor que inúmeros marroquinos vêm à França para continuar seus estudos superiores (+ 5 pontos entre 2009 e 2012). 56% dos imigrantes argelinos que se instalaram na França são mulheres.

Portugal: 8% dos imigrantes de 2012



A imigração portuguesa foi retomada com a crise - (© Hugh O'Neill - Fotolia.com)

É de Portugal que vem hoje o maior contingente de imigrantes para a França, segundo os dados publicados pelo Insee. A composição sociológica desse grupo de novos imigrantes deixa supor uma imigração ligada ao emprego: 86% dos homens que chegaram em 2012 declararam ter um emprego no início de 2013. Essa é a taxa [de emprego] mais elevada entre os 17 países analisados pelo Insee. Os novos imigrantes oriundos de Portugal são bastante majoritariamente compostos de homens (55%) e poucos têm diploma: 56% deles não possuem diploma secundário ou universitário. Sua idade média é de 27 anos. Inúmeros cidadãos portugueses haviam chegado à França nos anos 1970 e 1980 por razões econômicas -- o fluxo parece se restabelecer após a crise de 2008. 



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