terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Os segredos de Stonehenge começam a aflorar

[Para esta postagem utilizei como referências uma reportagem de Kenneth Chang do International New York Times, a Wikipédia e outras fontes da internet.]

Descobertas na década passada trouxeram mais revelações sobre o povo para o qual Stonehenge e monumentos vizinhos tinham grande significado - (Foto: Adam Stanford/Aerial-Cam)

Stonehenge (do inglês arcaico "stone" = pedra, e "henge" = eixo) é um alinhamento megalítico da Idade do Bronze, localizado na planície de Salisbury, próximo a Amesbury, no condado de Wiltshire, no sul da Inglaterra. Constituí-se no mais visitado e conhecido círculo de pedras britânico, e até hoje é incerta a origem da sua construção, bem como da sua função, mas acredita-se que era usado para estudos astronômicos, mágicos ou religiosos. 
O Stonehenge é uma estrutura composta, formada por círculos concêntricos de pedras que chegam a ter cinco metros de altura e a pesar quase cinquenta toneladas, onde se identificam três distintos períodos construtivos:
  • O chamado Período I (c. 3100 a.C.), quando o monumento não passava de uma simples vala circular com 97,54 metros de diâmetro, dispondo de uma única entrada. Internamente erguia-se um banco de pedras e um santuário de madeira. Cinquenta e seis furos externos ao seu perímetro continham restos humanos cremados. O círculo estava alinhado com o pôr do Sol do último dia do Inverno, e com as fases da Lua.
  • Durante o chamado Período II (c. 2150 a.C.) deu-se a realocação do santuário de madeira, a construção de dois círculos de pedras azuis (coloridas com um matiz azulado), o alargamento da entrada, a construção de uma avenida de entrada marcada por valas paralelas alinhadas com o Sol nascente do primeiro dia do Verão, e a construção do círculo externo, com 35 pedras que pesavam toneladas. As altas pedras azuis, que pesam quatro toneladas, foram transportadas das montanhas de Gales a cerca de 24 quilômetros ao Norte.
  • No chamado Período III (c. 2075 a.C.), as pedras azuis foram derrubadas e as pedras de grandes dimensões (megálitos) - ainda no local - foram erguidas. Estas pedras, medindo em média 5,49 metros de altura e pesando cerca de 25 toneladas cada, foram transportadas do Norte por 19 quilômetros. Entre 1500 a.C. e 1100 a.C., aproximadamente sessenta das pedras azuis foram restauradas e erguidas em um círculo interno, com outras dezenove, colocadas em forma ferradura, também dentro do círculo.
Estima-se que essas três fases da construção requereram mais de trinta milhões de horas de trabalho.
O mais famoso monumento da pré-história pode ter sido um centro de cura, para onde iam peregrinos há mais de 4.500 anos. A afirmação é de um grupo de arqueólogos que trabalha nas primeiras escavações em mais de 40 anos no monumento. O grupo acredita ter encontrado indícios que podem, finalmente, explicar os mistérios da construção de blocos de pedra. A equipe descobriu um encaixe que, no passado, abrigou as chamadas pedras azuis, rochas vulcânicas de tom azulado, a maioria já desaparecida, que formava a primeira estrutura construída no monumento. Eles acreditam que as pedras azuis podem confirmar a tese de que Stonehenge era um local onde as pessoas iam em busca de cura.
Segundo a citada reportagem do International NYT, há cerca de 6.300 anos atrás, uma árvore caiu nessa região do sul da Inglaterra. Para os habitantes locais, isso criou uma oportunidade imobiliária excepcional: próximo de uma fonte e perto de áreas de caça atraentes. 
Segundo David Jacques, um arqueólogo da Universidade de Buckingham, lama foi comprimida sobre as raízes expostas, transformando-as em um muro. Ao lado, um poste foi enfiado no solo e isto pode ter sustentado um teto de grama ou de pele de animal. Isso foi, disse ele, uma casa, uma das primeiras da Inglaterra.
Em outubro, nas escavações mais recentes em um local conhecido como Blick Mead, o Dr. Jacques e sua equipe cavaram uma vala de 12,2 m de extensão (40 pés), 7 m (23 pés) de largura e 1,5 m (5 pés) de profundidade, examinando aquela estrutura e seus arredores. Encontraram uma lareira com pedaços de quartzo fragmentado a fogo, pedaços de ossos, partículas de quartzo usado como pontas de setas e como ferramentas de corte e uns tipos de vagens que podem ter sido usadas como pigmentos. "Há algo aqui", disse o arqueólogo, imaginando o que acontecia em 4300 a.C. "Havia gente aqui fazendo coisas. Exatamente como nós. As mesmas pessoas e as mesmas preocupações". 
A apinhada vizinhança de Stonehenge -- Pesquisadores usando imagens aéreas, radar de penetração no solo e outras técnicas estão descobrindo novos detalhes na paisagem ao redor de Stonehenge. Na sequência  de fotos acima (ver na reportagem), a partir do topo e no sentido horário:  Blick Mead - Em outubro, pesquisadores escavaram a área no entorno de um abrigo construído ao redor de uma árvore caída, construído cerca de 4.300 a.C.. A casa se antecipa a Stonehenge em mais de 1.000 anos, mas sugere que houve progressão dos primeiros britânicos, caçadores, para os fazendeiros que construíram Stonehenge e os monumentos ao seu redor. -- West Amesbury Henge - Está ligado a Stonehenge por um caminho ou trilha de procissão. As pessoas na foto estão em pé em áreas escavadas na rocha. O local é conhecido também como Bluestonehenge, e alguns pesquisadores consideram que as pedras que faltam foram deslocadas para Stonehenge por volta de 2.400 a.C.. -- Durrington Walls - É um vilarejo neolítico rodeado de aterros, e datado entre 3.500 e 2.400 a.C..Imagens de radar mostram uma fila de pedras enterradas em pé. -- Woodhenge - Houve uma época em que este local concentrou anéis concêntricos de postes de madeira. -- Stonehenge - Foi construído em múltiplos estágios, evoluindo de um anel de terra de cerca de 3.000 a.C. para um elaborado círculo de pedras da Idade do Bronze erigido e rearrumado a partir de 2.600-1.600 a.C.. --(Fonte: International New York Times)
Entre os artefatos encontrados em Blick Mead havia uma grande quantidade de pontas de setas/lanças e ferramentas de corte feitas de quartzo - (Foto: Andrew Testa/The New York Times) 

Blocos de concreto marcam os locais onde existiam estacas de  madeira em Woodhenge - (Foto: Andrew Testa/The New York Times)
A cerca de 1,6 km (1 milha) de distância está Stonehenge. Para o Dr. Jacques, a casa faz parte da história de Stonehenge, mesmo que os ocupantes de Blick Mead jamais tenham presenciado a montagem daquelas pedras maciças. Os inícios de Stonehenge estariam a mais de um milênio no futuro. Mas Blick Mead, disse ele, ajuda a preencher o vazio de caçadores que se tornaram fazendeiros e depois construíram Stonehenge e outros monumentos pré-históricos que marcam a paisagem rural inglesa. "Este é o primeiro capítulo desconhecido de Stonehenge", disse o Dr. Jacques.
Stonehenge tem cativado gerações. Ao longo dos anos, arqueólogos têm catalogado as rochas, tentado adivinhar o significado da maneira como foram colocadas -- alinhadas para o nascer do sol em meados do verão e para o pôr do sol em meados do inverno -- e estudado os ossos humanos e de animais ali enterrados. 

O sol do solstício de inverno sobre Stonehenge - (Foto: Simon Wakefield)
Há tempos, eles conhecem também outros monumentos locais -- câmaras mortuárias, uma colina de 39,5 m de altura (130 pés) de giz (calcáreo) conhecido como Silbury Hill e muitas outras estruturas circulares. Um levantamento aéreo em 1925 revelou círculos de peças de madeira, agora conhecidos como Woodhenge, a 3,2 km de Stonehenge. 
Próximo a Avebury há um outro monumento imenso: uma colina artificial construída com calcáreo (giz), conhecida como Silbury Hill. Essa colina de 39,5 m de altura tem aproximadamente a mesma altura e o mesmo volume que uma das pirâmides de tamanho médio do Egito. Arqueólogos não encontraram sinal de tumba em seu interior e permanecem intrigados quanto ao motivo pelo qual foi construída - (Foto: Google) 

"O monumento de pedra é um ícone", disse Wolfgang Neubauer, o diretor do Instituto Ludwig Boltzmann para Prospecção Arqueológica e Arqueologia Virtual em Viena. "Mas é apenas uma pequena parte da coisa toda". 

Um desfile de monumentos
A história da Bretanha começa no final da última idade do gelo. No frio, a Bretanha ficava despovoada. Com tanta água do oceano congelada nos glaciares, o nível do mar era mais baixo e a Bretanha estava  ligada ao resto da Europa. Com o aquecimento global, os habitantes recuaram até que as águas  crescentes destruíram a ponte de terra. 
Por volta de 3.800 a.C. surgiram os primeiros grandes monumentos -- montes retangulares, conhecidos como túmulos longos, que serviam como câmaras mortuárias. 
Por volta de 3.500 a.C., foi cavada uma vala de 3,2 km de extensão e 91,4 m de largura próximo ao local de Stonehenge no que ficou conhecido como Stonehenge Cursus ("cursus" é a palavra latina para pista de corrida ou hipódromo -- quem a descobriu no século 18 achou que se tratava de uma pista desse gênero construída pelos romanos).  O primeiro estágio de Stonehenge propriamente, uma vala circular para fundação, foi escavada por volta de 2.900 a.C. e ali se erigiram anéis de madeira. 
Cerca de 400 anos mais tarde veio um apogeu de henges (estruturas circulares). -- A característica determinante de um henge não é a presença de estacas de pedra ou madeira apontadas para cima, mas uma vala circular rodeada por uma margem elevada. Sob este aspecto, Stonehenge hoje não é um henge autêntico: sua margem elevada está dentro da vala --.
32 km ao norte de Stonehenge situa-se Averbury, com três círculos de pedras, o mais externo deles com mais de 304 m de diâmetro -- é tão grande, que a cidade de Averbury avançou para dentro dele. No centro há um pub, o Red Lion, fundado há quatro séculos. Mais próxima de Stonehenge está Durrington Walls, uma  estrutura circular de terra de cerca de 488 m de diâmetro.  
 Um dos círculos de pedra de Averbury - (Foto: Google)
Michael Parker Pearson, da Universidade College London, escavou casas em Durrington Walls e ao longo do vizinho rio Avon e considera que esse é o local onde viveram os construtores para o maior estágio da construção de Stonehenge, que começou por volta de 2.600 a.C.. As pedras gigantescas, algumas pesando 40 toneladas, foram transportadas e entalhadas. Pearson acredita que pedras menores de arenito cinzento, de cerca de 2 toneladas cada, tenham sido levadas para Stonehenge das montanhas Preseli em Gales e depois outras maiores foram arrastadas para lá.
Como os britânicos antigos não tinham linguagem escrita, a pergunta mais simples -- por que isso foi construído? -- permanece sem resposta conclusiva. 
Na opinião do Dr. Pearson, Durrington Walls era a terra dos seres vivos, simbolizada pelas madeiras de Woodhenge, enquanto Stonehenge era a terra dos mortos. Ele acredita que os britânicos primitivos se reuniam em Durrington Walls para festejar, e depois se dirigiam para Stonehenge para honrar seus ancestrais.
Em outubro, na revista Antiquity (Antiguidade), o Dr. Pearson e seus colegas descreveram resíduos de ácido gorduroso que identificaram dentro de vasilhames para cozinhar. "Identificamos o cardápio: carne e porco, cozidos e grelhados, com um punhado de maçãs, frutas vermelhas e avelãs. Eles comiam basicamente uma dieta muito forte em carne". 
As pessoas vinham de pontos próximos e remotos para as festividades, disse o Dr. Pearson. Ele mencionou que a análise de dentes de gado mostrou diferentes isótopos do elemento estrôncio, que variam com base nos minerais locais existentes na água, indicando que os animais haviam sido criados em outro lugar e então levados para Durrington Walls. 
Timothy Darvill, da Universidade de Bournemouth, que liderou uma pequena escavação em Stonehenge em 2008, tem uma opinião diferente sobre o significado do monumento, apontando para as pedras de arenito cinzento que, segundo ele, não foram adicionadas ao monumento até sua segunda fase, por volta de 2.500 a.C., e segundo a lenda possuem propriedades curativas. "Essas pedras são muito especiais", disse o Dr. Darvill. "Talvez seu significado não tenha sido compreendido por completo".
Ele disse que Stonehenge pode originalmente ter sido a "terra dos mortos", como afirma o Dr. Pearson, mas mais tarde transformou-se em uma espécie de Lourdes pré-histórica, para onde as pessoas se dirigiam em busca de cura.  
Espiando o passado
Muito mais coisas existem debaixo da superfície. "Presumimos que os fragmentos que conhecemos são os importantes", disse Vincent Gaffney, da Universidade de Bradford. "O que temos que fazer é descobrir o que realmente existe lá".  
A ideia de utilizar radar de penetração em solo e magnetômetros para espiar dentro do solo sem escavar remonta a décadas.  Em anos recentes, os equipamentos -- principalmente os computadores para analisar os dados -- tornaram-se baratos o suficiente, também em termos de rapidez, para permitir seu uso na arqueologia. 
Arqueólogos concentraram seu foco nos grandes monumentos, porque cavar por todo lado demandaria muito tempo e destruiria a paisagem. Entretanto, o radar de penetração no solo permitiu expandir a investigação sobre o que pode estar escondido no solo no entorno de Stonehenge - (Foto: Geert Verhoeven/ Ludwig Boltzmann Institute)
Medições por indução eletromagnética em Stonehenge - (Foto: The Institution of Engineering and Technology)
Dr. Neubauer colaborou com o Dr. Gaffney para pesquisar uma área de 20,7 km² no entorno de Stonehenge e Durrington Walls. "Foi como um exército atravessando a região", disse o Dr. Gaffney.  Em setembro, eles anunciaram um feito surpreendente: enterradas nas margens ou bancos de Durrington Walls há cerca  de 90 pedras em pé, algumas com até 4,6 m de altura. O Dr. Gaffney disse que pode ter havido originalmente 200 delas, mais do dobro do número existente em Stonehenge. "Isso nos dá ideia da escala disso", disse ele. 
Arqueólogos anunciaram em setembro que as varreduras por radar haviam revelado 90 pedras enterradas em pé em Durrington Walls, uma estrutura circular de terra a cerca de 3,2 km de Stonehenge.  Essa é uma visão estimada por um artista de como poderia ter sido a aparência desse antigo "superhenge" - (Foto: Ludwig Boltzmann Institute)
Se isso for verdade, prejudicará a tese do Dr. Pearson de classificar Durrington Walls como a terra dos vivos e Stonehenge como a terra dos mortos. Mas, ele é cético sobre essas descobertas, que ainda não foram publicadas em uma publicação técnica revisada por outros pesquisadores (pares). 
Dr. Pearson disse que há uma década escavou alguns desses locais e encontrou buracos de postes ou estacas, que foram cobertos por giz com cimento. Os reflexos do radar ricochetearam nos blocos de giz, disse ele. "O "x" da questão é que as pedras na realidade não são pedras", disse o Dr. Pearson. Ele disse que discutiu com Dr. Gaffney sobre as diferenças nas interpretações de ambos. "Cavaremos um buraco no ano que vem [2016] para resolver isso de uma vez por todas", disse ele.
Um lugar de mistério
Ainda não se sabe como a área de Stonehenge se tornou um local venerado. A evidência mais intrigante disso está bem ao lado do próprio Stonehenge: a existência de três grandes buracos de postes ou estacas que continham postes ou estacas de madeira semelhantes a totens. Carvão e ossos nos buracos foram datados entre 8.000 e 7.000 a.C.. "Isso leva a questão de se ter um local especial já reconhecido por um povo muito, muito tempo antes de Stonehenge", disse o Dr. Pearson. "Essa é uma questão que um dia seremos capazes de resolver". 
Esses buracos de postes/estacas são bem mais velhos do que qualquer outra coisa na área, exceto o sítio de Blick Mead e um outro buraco semelhante recentemente datado. 
O D. Jacques disse que os ossos de animais lá existentes -- em sua maioria auroques, os grandes ancestrais do gado de hoje, mas também veados vermelhos e javalis -- datam de 7.500 a.C., coincidindo com os buracos de postes de Stonehenge. A conexão entre eles é especulativa, mas pode ter sido aí onde viveram os construtores dos totens de Stonehenge. 
A fonte de água lá está cheia de ferramentas de quartzo e de ossos descartados. Dr. Jacques pinta Black Mead como talvez um precursor das celebrações de Durrington Walls. Alimentada a partir do subsolo, a fonte nunca congela e pode, também, ter parecido como algo mágico. 
Poucos anos atrás, um voluntário -- a mãe do Dr. Jacques -- tirou da fonte uma rocha de aparência interessante e a colocou em seu bolso. Poucas horas depois, a cor da rocha se tornara um vermelho vivo, uma reação das algas sobre a rocha ao oxigênio do ar. 
A rocha que mudou de cor depois de retirada da fonte de água de Blick Mead - (Foto: Google)
Algas crescem apenas em certas condições parcialmente expostas a sombra, e essas condições podem não ter se alterado muito em 9.500 anos. "Estamos começando a perceber que este é um lugar especial, onde coisas especiais estão acontecendo", disse o Dr. Jacques. 
Ele espera poder expandir as escavações para buscar não apenas por uma casa, mas por um vilarejo.  "Essas pessoas são os primeiros britânicos", disse ele. "Encontramos o berço de Stonehenge". 
Após o término da fase de grande construção de Stonehenge, cerca de 2.400 a.C., o monumento foi modificado, mas a era dos megamonumentos havia terminado. "Essa é a época em que basicamente seu mundo mudou", disse o Dr. Pearson. Novos povos cruzaram o canal vindo da Europa, trazendo bronze e a produção de metais para a cultura da idade da pedra. "É uma  mudança muito interessante", disse ele. "De certo modo, Stonehenge é o canto do cisne". 



2 comentários:

  1. Recebido por email em 12/01/2016

    Excelente texto! Tentei comentar no site, mas acho que não entrou, esse lugar é realmente intrigante e sensacional!
    Abs

    Bicudo

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